Em evento realizado hoje em Brasília -solenidade intitulada “Democracia Inabalada”, - com a presença de representantes dos Três Poderes da República e de diversas autoridades, foram lembrados os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, que completam um ano no dia de hoje.
Uma ausência emblemática
foi a do presidente da Câmara dos Deputados Arthur Lira (PP-AL), aliás, a
maior parte dos políticos ligados ao “centrão” não compareceu. Além
disso, há alguns dias, um manifesto de repúdio à solenidade foi assinado por
trinta senadores, a maioria do PL, PP, Republicanos, Novo e Podemos entre
outros (algumas destas siglas respondem por ministérios no governo). Os
signatários criticam um suposto abuso de poder por parte STF (Superior Tribunal
Federal), que, segundo o documento, vem tentando assumir um protagonismo despropositado através interpretações arbitrárias do texto constitucional, gerando um desequilíbrio entre os poderes e possíveis ameaças à democracia. Ainda que repudie os atos praticados no 8 de janeiro de 2023, o manifesto também considera abusivas
as penas atribuídas pelo STF aos manifestantes condenados.
O que me espanta é que,
apesar de tudo, da violência desmedida contra o patrimônio público e da
evidente intenção de subverter a ordem constitucional, a gravidade dos fatos ainda
é “relativizada” por parte considerável da sociedade brasileira. Este “relativismo”,
é claro, é velado; está escondido nas entrelinhas, nas “desculpas esfarrapadas”,
nas falsas intenções, nos discursos equivocados em nome da liberdade de
expressão e no patriotismo intolerante.
Contudo, até agora, contamos
com trinta condenações, a maioria em regime aberto. Nos casos mais graves - abolição do Estado Democrático
de Direito, associação criminosa e deterioração do patrimônio público tombado- a pena chega a dezessete
anos de reclusão. Das mais de duas mil pessoas presas entre os dias 8 e 9 de
janeiro de 2023, quase novecentas aguardam julgamento em liberdade provisória.
Trinta e três réus, vinte e cinco investigados e oito dos trinta já condenados
permanecem presos.
A grande maioria dos
condenados, réus e investigados são o que se costuma chamar de “massa de
manobra”, ao menos segundo as informações que se tem até o momento.
“O que a gente tem
visto é um financiamento muito horizontal, porque a extrema-direita no Brasil,
assim como em boa parte do mundo neste tempo, é um fenômeno social real, com
base de massa real [...]. Boa parte
desse financiamento é de comerciantes de cidades pequenas, de cidades médias.”
Disse o ministro da justiça em exercício Ricardo Cappelli numa entrevista
concedida à revista CartaCapital no dia 8 de janeiro de 2024 (https://www.cartacapital.com.br/politica/8-de-janeiro-faz-um-ano-com-executores-enquadrados-e-interrogacao-sobre-bolsonaro-e-militares/).
Na mesma entrevista, o
atual ministro diz ainda:
“Foram quatro anos do
ex-presidente [Jair Bolsonaro] atacando as instituições, incitando a população
contra as instituições, e essa situação se agravou após o resultado do segundo
turno, quando foram montados aqueles acampamentos em frente aos
quartéis-generais do Exército [...]. Não há precedente na história do Brasil de
acampamentos golpistas montados em frente aos quartéis-generais do Exército”.
Quem sustentava os
manifestantes acampados em frente aos quartéis do Exército em Brasília? Quem
financiou o transporte e a alimentação das caravanas que chegaram para encorpar
os protestos? Tudo isto foi realmente planejado somente através das redes
sociais e financiado de forma “muito horizontal”, como sugere Ricardo Cappelli?
E a leniência das forças de segurança antes e durante os protestos? E o tal
esboço de decreto descoberto pela Polícia Federal na casa de Anderson Torres,
ministro da justiça do governo Bolsonaro, que serviria para instalar uma
espécie de “estado de defesa” na sede do TSE em Brasília?
NOTA: o TSE (Tribunal
Superior Eleitoral) sempre foi alvo de críticas do ex-presidente Bolsonaro sobre
lisura do processo eleitoral, principalmente em relação à possibilidade de
fraudes na utilização das urnas eletrônicas.
Ainda são muitas
perguntas sem resposta, mas o quadro geral que se pode desenhar a partir das
investigações realizadas até o momento sugere a existência de uma trama bem
complexa, com o envolvimento das forças de segurança do Distrito Federal, das
Forças Armadas, principalmente do Exército, da Polícia Rodoviária Federal e de
políticos de extrema-direita. Talvez, a quebra do sigilo bancário de alguns
“atores”, principalmente daqueles “comerciantes de cidades pequenas, de cidades
médias” citados pelo ministro Cappelli, possa trazer mais luzes ao caso.
O mais importante,
porém, é que o resultado das eleições de outubro de 2022 foi mantido,
prevaleceu a solidez das instituições democráticas e o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva, empossado em 01 de janeiro de 2023 consolidou-se no comando da
nação.