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terça-feira, 16 de janeiro de 2024

O Caso Lula

Incrível o que aconteceu nas eleições para presidente da república em 2022 no Brasil: Luis Inácio Lula da Silva foi eleito presidente pela terceira vez com mais de sessenta milhões de votos, apertados 50,9% dos votos válidos, é verdade, mas foi surpreendente assim mesmo.

Surpreendente porque, após sua candidatura ter sido barrada nas eleições de outubro de 2018 pela “Lei da Ficha Limpa” (eleições que dariam a vitória a por Jair Bolsonaro naquele ano), por uma condenação em segunda instância em abril/2018 -corrupção ativa e lavagem de dinheiro no “caso do Triplex de Guarujá” -, Lula tornou-se elegível novamente com a anulação, pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em abril de 2021, desta e de mais outra condenação que pesava sobre ele.

Em 27 de novembro de 2019, Lula ainda foi condenado, também em segunda instância, por corrupção ativa e lavagem de dinheiro no “caso do Sítio de Atibaia” e também haviam os “casos do Instituto Lula” (suspensos por habeas corpus impetrado no STF em fevereiro de 2021), entre outros. Se somarmos as penas das duas condenações em segunda instância (Guarujá e Atibaia) chegaremos a mais de vinte e cinco anos.

Chama a atenção a sequência de eventos e circunstâncias que fizeram Lula chegar vitorioso no dia 30 de outubro de 2022 (dia da eleição para presidente).

1º) Depois de idas e vindas, no dia 7 de novembro de 2019, o STF retomou um entendimento de 2009 afirmando que o cumprimento de qualquer pena só poderia ter início após o julgamento e condenação na última instância, neste caso, no STF (exceto nos casos em que são atendidos os requisitos da prisão preventiva, o que não se aplicava ao caso em questão). Como ainda cabiam recursos na suprema corte, Lula foi libertado provisoriamente. Na ocasião, ele já havia cumprido um ano e sete meses de prisão (de abril de 2018 a novembro de 2019) na carceragem da Polícia Federal (PF) em Curitiba/PR.

Na saída da carceragem da PF, Lula falou para uma multidão que o aguardava: "[...] eu consegui a proeza de, preso, arrumar uma namorada [...]". Escondido nesta declaração, há um alerta bem humorado para os seus opositores: imaginem o que eu posso fazer solto...

2º) Em 15 de abril de 2021, o plenário do STF decretou, por 8 votos a 3, a anulação das quatro ações penais contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no âmbito da Operação Lava Jato em Curitiba, confirmando a decisão emitida pelo ministro Edson Fachin no dia 8 de março.
Fachin havia concluído que os processos contra Lula não estavam diretamente relacionados à corrupção na Petrobras, objetivo principal da operação “Lava Jato”, e que, por isso, a 13ª Vara Federal de Curitiba, que estava sob o comando do juiz Sérgio Moro durante a maior parte da Operação Lava Jato era incompetente para analisar e julgar as ações penais contra o ex-presidente (atendendo ao habeas corpus impetrado pela defesa do ex-presidente em novembro de 2020). Porém, o ministro determinou que os processos fossem encaminhados à Justiça Federal no Distrito Federal (destino que gerou controvérsias) a quem caberia a avaliação sobre o aproveitamento, ou não, dos dados processuais produzidos pela 13ª Vara Federal de Curitiba.
Na mesma decisão, Fachin negou os habeas corpus impetrados em 2018 pela defesa de Lula que alegavam a “suspeição de parcialidade” de Moro no julgamento do ex-presidente. A tese de suspeição ganhou repercussão na mídia com a publicação de diálogos entre Moro e os procuradores da Lava Jato pelo site The Intercept Brasil. Os diálogos levantavam suspeitas de conluio entre o juiz e o Ministério Público na condução dos inquéritos contra o ex-presidente Lula.

3º) No dia 23 de junho de 2021, depois de algumas polêmicas, o plenário do STF manteve, por 7 votos a 4, a decisão da Segunda Turma que declarou a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro na condenação de Luiz Inácio Lula da Silva no caso do triplex de Guarujá (depois, a decisão foi estendida aos casos do sítio de Atibaia e do Instituto Lula). Desta forma, as provas colhidas também foram invalidadas e não poderiam ser usadas em um eventual novo julgamento. Caso houvesse um novo processo, ele deveria começar do “zero”.
A suspeição de parcialidade do juiz Moro foi admitida por causa de alguns atos, tais como: permitir a divulgação pela imprensa do conteúdo de ligações telefônicas entre Lula, seus advogados e outras pessoas, interceptados pela Polícia Federal (PF) em março de 2016, antes de acusá-lo formalmente no caso do triplex de Guarujá em maio do mesmo ano; permitir o “vazamento” de um mandado de condução coercitiva em março de 2016, sem que o ex-presidente tivesse sido intimado previamente, como é de praxe (imagens de Lula publicadas pela imprensa na ocasião davam a impressão de que ele estivesse sendo preso); adiar, em agosto de 2018, um depoimento de 11 de setembro para 14 de novembro sob a alegação de que Lula poderia explorar politicamente o evento (embora estivesse preso, Lula pretendia concorrer às eleições presidenciais marcadas para outubro daquela ano -sua candidatura só foi impugnada em 01 de setembro), entre outras.
Em agosto de 2021, a 12ª Vara Federal de Brasília, rejeitou a nova denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra Lula no caso do sítio de Atibaia alegando não terem sido apresentadas novas provas que pudessem ser admitidas após a anulação do processo anterior pelo STF. Em dezembro de 2021, o MPF, através da Procuradoria da República no Distrito Federal, pediu o arquivamento do caso do triplex de Guarujá sob a alegação de “prescrição de prazo” para os supostos crimes cometidos pelo ex-presidente.

Enfim, posso dizer que o meu interesse, implícito neste post, resume-se na seguinte pergunta:

por que o habeas corpus que alegava a falta de imparcialidade do juiz da Lava Jato, impetrado pela defesa do ex-presidente em novembro de 2018 só mereceu o deferimento pelo STF em junho 2021? A parcialidade do Juiz Sérgio Moro era notória e amplamente documentada desde 2016.


CONTINUA