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terça-feira, 1 de fevereiro de 2022

Mais alguma coisa doutor?

As mulheres conhecem bem, desde pequenas, o tipo de tratamento diferenciado que lhes é imposto pelo sexo masculino. Não só tratamento, mas também comportamento. 

Do que estou falando? Bem, é daquele olhar invasivo sobre nossos corpos, seguidos ou não de elogios obscenos. Até bem pouco tempo atrás, eu, uma mulher de 51 anos, achava isso algo quase normal, hoje considero invasivo e ofensivo, sobretudo quando acompanhado do raciocínio de que as mulheres facilitam essa invasão por causa de alguma roupa, ou pela falta dela, ou por causa de algum comportamento específico. Outras atitudes, poderia citar: aquele toque indesejado, seja no ônibus, numa conversa, numa aula e até em reuniões de família. Se poderia dizer “Ah, mas, então, agora tudo é proibido?!”, porém a malícia destas situações é facilmente identificável, algo muito diferente é o contato afetuoso que ocorre nessas situações. 

Mas não só a malícia e a atitude invasiva foram normalizadas tanto por homens como por mulheres. A natural deferência dada ao conviva do sexo masculino em momentos sociais força nós mulheres a ocuparmos o lugar da subordinada. Verdade que em alguns ambientes mais do que noutros, mas sua mera existência, em pleno século XXI, já demonstra que há muito a caminhar. 

E por que sinto assim? Um simples jantar me fez reviver esse papel de mulher subordinada, o conhecido “gatilho”. Em diversos momentos foi perguntado ao meu marido pelo garçom: "mais alguma coisa doutor?" Não se trata de me sentir ofendida, compreendo que há um meio social em que isto parece correto e educado. Porém, espero que a minha filha, hoje uma menina de nove anos, não assimile este tipo de "normalidade" e que, num futuro bem próximo, ao final de um jantar hipotético, ela já esteja habituada a ouvir "Mais alguma coisa para vocês?". Que sonho!


Texto enviado ao blog por Adriana Menezes de Simão Kuhn